A visão microscópica da ameba invasora de cérebros, conhecida como Naegleria fowleri, já é assustadora: revela um conjunto de estruturas de alimentação retorcidas no formato de uma máscara de palhaço macabra. Mais assustador ainda é o que o organismo parasita faz. Habitantes de água doce, a ameba já infectou 128 pessoas desde 1962. Apenas uma sobreviveu. Agora, a garotinha Kali Hardig pode muito bem se tornar a segunda. A menina de doze anos, que vive em Arkansas, nos Estados Unidos, contraiu uma rara forma de meningite parasitária a mais de duas semanas atrás. Enquanto a maioria das vítimas morre dentro de uma semana da exposição, a ameba agora parece estar ausente do fluido espinhal de Hardig. Nos últimos dias, os médicos têm retirado lentamente as máquinas utilizadas para regular a respiração e a temperatura corporal de Hardig, diminuindo a dose de seus sedativos e a tirando da diálise. Até domingo (3), a garota já estava respondendo a perguntas dos membros da sua família.O epidemiologista de Centros de Controle de Doenças, Jonathan Yoder, explica que enquanto as infecções da N. fowleri são muito raras. A ameba – que normalmente faz a sua casa nas águas frescas de locais mais quentes – começou a se desenvolver nas regiões mais setentrionais dos EUA, incluindo os estados do Kansas, Indiana e até Minnesota.
Algo mais complexo e menos explorado é o desafio que a N. fowleri representa para funcionários de saúde pública que procuram aumentar a consciência da população sobre a sua presença. Em entrevista ano passado, após a morte de duas crianças que contraíram a ameba enquanto nadavam em um lago no estado de Minnesota, Yoder contou que, por um lado, a própria ameba é incrivelmente comum. Uma pesquisa realizada há décadas encontrou amostras da ameba em cerca de metade dos lagos examinados. Entretanto, a taxa de infecção nesses locais eram incrivelmente baixas. E enquanto os métodos de rastreio atuais podem nos dizer se existe ou não N. fowleri em um determinado lugar, os pesquisadores ainda não possuem nenhuma maneira correta de detectar o quanto do parasita realmente está presente lá.
E esse é o grande desafio para epidemiologistas no momento. “Nós podemos encontrá-los em diversos lugares, onde muitas pessoas nadam, mas não parece haver infecções lá – ou pelo menos nenhuma de que nós estamos cientes”, disse à época. Além disso, a impossibilidade de quantificar a N. fowleri significa que não há maneira de saber se a quantidade do parasita está de alguma forma relacionada à quantidade de pessoas infectadas por elas.E isso cria um desafio interessante, segundo Yoder, do ponto de vista de saúde pública: quando a prevalência de N. fowleri é alta, mas as taxas de infecção são baixas, o que devemos dizer às pessoas quando o encontramos? Aliás, a questão mais oportuna talvez seja: o que diremos às pessoas quando descobrirmos que elas estão se espalhando?
Leve em consideração, por exemplo, que Kali Hardig é a segunda pessoa em três anos a se infectar pela N. fowleri depois de nadar no lago Willow Springs Park, na cidade de Little Rock, local de veraneio visitado por milhares e milhares de pessoas todos os anos. (Agora o parque se encontra fechado voluntariamente pelos proprietários, logo após a infecção de Hardig. O site do local informa que está atualmente “Sob Renovação”).
Então, o que deve ser feito? O conselho de Yoder à população é: esteja ciente de que a ameaça existe – apesar de improvável –, especialmente nos meses de verão, quando as temperaturas da água esquentam e chegam a atingir mais de 30 graus Celsius. Se você entrar na água, Yoder não sugere que mergulhe com sua cabeça. Se você ainda assim quiser colocar a cabeça embaixo d’água, use um clipe nasal. “Qualquer coisa que você faça para reduzir o risco de a água acabar entrando em seu nariz provavelmente reduz o risco de infecção”, declara.
As infecções causadas por amebas de vida livre – caso da Naegleria – são erráticas, ou seja, não deveriam ocorrer no organismo humano. Por esse motivo, sua evolução no organismo é extremamente rápida e, geralmente, acomete o sistema nervoso central. O tratamento existe, mas, pela rapidez com que se dissemina, não há tempo para cura ou sequer para o diagnóstico. “A maioria dos diagnósticos de Neagleria é feito post mortem”, explica o pesquisador brasileiro Marco Túlio Alves da Silva, do Grupo de Cristalografia do Instituto de Física de São Carlos (IFSC/USP).No Brasil, especialistas atentam para a falta de dados sobre a ameba e a doença mortal causada por ela. Embora o número de vítimas do Naegleria seja melhor contabilizado nos EUA, a doença causada pela ameba faz vítimas no mundo todo. “O que falta, no Brasil, são dados específicos sobre a Neagleria. Não temos o número de casos no Brasil, regiões mais expostas etc; não temos dados de como a atividade industrial pode aumentar ou diminuir o número de formas de Neagleria“, afirma o cientista.
Fonte: http://io9.com
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